Atividade Avaliativa
Interpretação e Compreensão do Texto / Língua Portuguesa / Letramento de Português
Ensino Fundamental II (8º e 9º ano) e Ensino Médio
20 questões discursivas
Conteúdo trabalhado: gênero textual crônica, localizar informações explícitas em um texto, uso de aspas.
ZAP (Moacyr Scliar)
Não faz muito que temos esta nova TV com controle remoto, mas devo dizer que se trata agora de um instrumento sem o qual eu não saberia viver. Passo os dias sentado na velha poltrona, mudando de um canal para outro — uma tarefa que antes exigia certa movimentação, mas que agora ficou muito fácil. Estou num canal, não gosto — zap, mudo para outro. Não gosto de novo — zap, mudo de novo. Eu gostaria de ganhar em dólar num mês o número de vezes que você troca de canal em uma hora, diz minha mãe. Trata-se de uma pretensão fantasiosa, mas pelo menos indica disposição para o humor, admirável nessa mulher.
Sofre, minha mãe. Sempre sofreu: infância carente, pai cruel etc. Mas o seu sofrimento aumentou muito quando meu pai a deixou. Já faz tempo; foi logo depois que nasci, e estou agora com treze anos. Uma idade em que se vê muita televisão, e em que se muda de canal constantemente, ainda que minha mãe ache isso um absurdo. Da tela, uma moça sorridente pergunta se o caro telespectador já conhece certo novo sabão em pó. Não conheço nem quero conhecer, de modo que — zap — mudo de canal. “Não me abandone, Mariana, não me abandone!” Abandono, sim. Não tenho o menor remorso, em se tratando de novelas: zap, e agora é um desenho, que eu já vi duzentas vezes, e — zap — um homem falando. Um homem, abraçado à guitarra elétrica, fala a uma entrevistadora. É um roqueiro. Aliás, é o que está dizendo, que é um roqueiro, que sempre foi e sempre será um roqueiro. Tal veemência se justifica, porque ele não parece um roqueiro. É meio velho, tem cabelos grisalhos, rugas, falta-lhe um dente. É o meu pai.
É sobre mim que fala. “Você tem um filho, não tem?”, pergunta a apresentadora, e ele, meio constrangido — situação pouco admissível para um roqueiro de verdade —, diz que sim, que tem um filho, só que não o vê há muito tempo. Hesita um pouco e acrescenta: “você sabe, eu tinha de fazer uma opção, era a família ou o rock”. A entrevistadora, porém, insiste (é chata, ela): “mas o seu filho gosta de rock? Que você saiba, seu filho gosta de rock?”
Ele se mexe na cadeira; o microfone, preso à desbotada camisa, roça-lhe o peito, produzindo um desagradável e bem audível rascar. Sua angústia é compreensível; aí está, num programa local e de baixíssima audiência — e ainda tem de passar pelo vexame de uma pergunta que o embaraça e à qual não sabe responder. E então ele me olha. Vocês dirão que não, que é para a câmera que ele olha; aparentemente é isso, aparentemente ele está olhando para a câmera, como lhe disseram para fazer; mas
na realidade é a mim que ele olha, sabe que em algum lugar, diante de uma tevê, estou a fitar seu rosto atormentado, as lágrimas me correndo pelo rosto; e no meu olhar ele procura a resposta à pergunta da apresentadora: você gosta de rock? Você gosta de mim? Você me perdoa? — mas aí comete um erro, um engano mortal: insensivelmente, automaticamente, seus dedos começam a dedilhar as cordas da guitarra, é o vício do velho roqueiro, do qual ele não pode se livrar nunca, nunca. Seu rosto se ilumina — refletores que se acendem? — e ele vai dizer que sim, que seu filho ama o rock tanto quanto ele, mas nesse momento zap — aciono o controle remoto e ele some. [...]
Após a leitura da crônica, responda as questões:
1. A que gênero textual pertence o texto lido?
2. Quem é o autor do texto?
3. Qual o título do texto?
4. Localize no primeiro parágrafo a frase que expressa a importância que a nova TV com controle remoto adquiriu para o narrador.
5. Descreva, com suas palavras, a principal vantagem que o controle remoto trouxe para o hábito de assistir televisão do narrador, comparando com a situação anterior mencionada no texto.
6. Copie a fala da mãe que demonstra sua opinião sobre a frequência com que o narrador muda de canal. Qual sentimento essa fala revela?
7. Segundo o texto, qual a principal causa do sofrimento da mãe do narrador após o nascimento do filho?
8. Releia o segundo parágrafo. Há quanto tempo o pai do narrador os deixou? Qual a idade do narrador atualmente?
9. O narrador menciona uma divergência de opiniões com a mãe sobre o tempo dedicado à televisão. Transcreva o trecho em que essa divergência é explicitada.
10. Qual a profissão do homem que aparece na televisão e que o narrador reconhece? Cite o trecho em que essa informação é dada.
11. Quais detalhes da aparência física desse homem fazem com que o narrador questione se ele realmente corresponde à imagem de um roqueiro?
12. A apresentadora faz uma pergunta sobre o filho do roqueiro. Copie a pergunta exata que causa constrangimento no entrevistado.
13. Justifique o uso de aspas no trecho: Hesita um pouco e acrescenta: “você sabe, eu tinha de fazer uma opção, era a família ou o rock”. A entrevistadora, porém, insiste (é chata, ela): “mas o seu filho gosta de rock? Que você saiba, seu filho gosta de rock?”
14. Qual a justificativa que o pai apresenta para não ver o filho há muito tempo?
15. O narrador descreve o olhar do pai como se fosse direcionado a ele. Transcreva a passagem em que o narrador expressa essa percepção.
16. Quais são as três perguntas que o narrador "ouve" no olhar do pai?
17. Que ação involuntária o pai começa a fazer com a guitarra?
18. Como o narrador reage a esse gesto do pai? Cite o trecho que descreve essa reação.
19. Explique, com suas palavras, a relação entre o título "ZAP" e a ação final do narrador no texto.
20. Após a leitura do texto, qual a sua principal impressão sobre a relação entre o narrador e o pai? Justifique sua resposta com elementos do texto.